10 de outubro de 2009
Algumas Considerações a Respeito da Aprendizagem da Leitura e da Escrita
Por Adriana Francisca de Medeiros
A leitura e a escrita, como tantas outras criações humanas, são uma invenção social. Na visão de Tfouni (2004,p.10):
A escrita é o produto cultural por excelência. É de fato, o resultado tão exemplar da atividade humana sobre o mundo, que o livro, subproduto mais acabado da escrita, é tomado como uma metáfora do corpo humano: fala-se nas “orelhas” do livro; na sua página de “rosto”; nas notas de roda “pé”, e o capítulo nada mais é do que a “cabeça” em latim.
Como sabemos, a escrita foi criada há milhões de anos por pessoas que sentiram a necessidade de registrar nas paredes das cavernas as impressões de seu mundo.
O processo de difusão e adoção dos sistemas escritos pelas sociedades antigas, no entanto, foi lento e sujeito, é obvio, a fatores político-econômicos. O mesmo se pode dizer sobre os tipos de códigos escritos criados pelo homem : pictográficos, ideográficos ou fonéticos , todos eles, quer simbolizem diretamente os referentes concretos , quer “representem” o “ pensamento”(ou idéias), ou ainda os sons da fala, não são produtos neutros; são antes resultado das relações de poder e dominação que existem em toda sociedade.(TFOUNI,2004,p.11)
A princípio, os desenhos representavam algo para quem os fazia, mas não eram por si uma escrita, porque não existia uma convenção dos símbolos escritos, e dessa forma não poderiam ser compreendidos, ou seja, lidos. A partir do momento que se procurou entender e interpretar essas inscrições nasceu a leitura. Desde o período da pré-história até os dias atuais os processos de leitura e da escrita evoluíram muito.
Cagliari (1998) levanta a hipótese de que, quem inventou a escrita foi a leitura. Segundo ele, no momento em que alguém teve que explicar para um estranho o que significavam aqueles desenhos, ele se pôs, de certo modo, a lê-los. “(...) Na verdade, a escrita só existe no momento em que alguém lê!” (op. cit., p. 28).
Ainda de acordo com Cagliari , as mais antigas manifestações de escrita, feitas com a intenção de leitura, eram executadas com símbolos, de representação figurativa de coisas da natureza. “(...) a escrita que começou ideográfica, acabou alfabética. (...) a finalidade de qualquer escrita é primariamente a leitura”.
Para responder às exigências de uma comunicação mais eficiente, inventaram-se as consoantes e as vogais e, no ocidente a linguagem tornou-se alfabética – cada som passou a ser representado por uma determinada letra.
Em Morais (1997) vamos encontrar o seguinte esclarecimento: A especialização e o aprofundamento das ciências em torno do universo humano deram lugar de destaque às atividades gráficas já que se tornou impossível transmitir todos os conhecimentos através da fala. Aprender a ler e a escrever deixou de ser privilégio dos mais abastados para se tornar uma preocupação de todos os governos, pois se transformou num termômetro de desenvolvimento social. (op. cit., p. 18)
No decorrer dos séculos, a escola conseguiu fazer transladação da função da escrita. Transformou-a de objeto social em objeto exclusivamente acadêmico.
A partir de reflexões a respeito da origem da escrita, perguntamos: qual tem sido ao objetivo da alfabetização, ou seja, da apropriação da leitura e da escrita para a criança ou para o homem na atualidade? Geralmente esses objetivos se delineiam de forma muito geral nos planos e programas educacionais e de forma muito contraditória na prática de sala de aula e nos exercícios propostos para aprendizagem.
É comum encontrarmos nos objetivos de planos de trabalho, que a criança deve alcançar “o prazer da leitura” e “que sejam capazes de fazer produções textuais”. Portanto, as práticas educacionais denunciam uma verdadeira contradição, os alunos na verdade, na maior parte do tempo que permanecem no âmbito escolar, são obrigados a reproduzir exercícios estereotipados, tirando do quadro “o que vai cair na prova”, para estudar em casa; os momentos destinados à produção e leitura significativa são mínimos e quase não existem. Esporadicamente somos testemunhas de produções do tipo “escreva como foram suas férias”.
A comunicação que é praticada na escola é fora de contexto, sem significado, sem sequer objetivar o acesso a informação, pois a maioria dos textos, trabalhados na escola são narrativas ou literatura de ficção descontextualizados, esquecendo dessa forma que, uma das funções principais da leitura ao longo de toda a escolaridade é a obtenção de informação a partir de escritos.
Resultados de pesquisas em nível nacional têm mostrado o déficit de leitura e escrita que nossos alunos chegam ao final da educação básica ou até mesmo à universidade. A maioria dos alunos apresenta inibição ao escrever com medo de cometer erros de ortografia e dificuldade de dizer por escrito o que são capazes de dizer oralmente. Sentem dificuldades em resumir texto, como também em reconhecer as idéias principais, e as conclusões que se apresentam ao final de cada texto.
A forma como se têm trabalhado os textos desde as séries iniciais, a ênfase na cópia, excluindo tentativas de criar representações significativas, sem levar em consideração o contexto e atualidade, faz com que a escrita se apresente como um objeto alheio à própria capacidade de compreensão. Está ali para ser copiado, reproduzido, porém não compreendido, nem recriado. Este pode ser um dos motivos que tem levado ao alto índice de analfabetos funcionais.
Um dos objetivos sintomaticamente ausente nos planos de trabalho dos professores de alfabetização e de Língua portuguesa, de crianças e jovens é o de compreender as funções da língua escrita e a empregabilidade da mesma na sociedade. Se há séculos a intencionalidade da escrita para o homem tem sido a leitura, se a escrita desde o seu cerne apresentou-se como uma forma de comunicação entre as pessoas, por que a escola não cumpre com esse papel? Por que na escola não se valoriza a função social da escrita? Por que as crianças escrevem tantas coisas sem nexos nos bancos escolares? Será que nós professores estamos sabendo o que ler e escrever?
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FONTE: http://www.amigosdolivro.com.br/lermais_materias.php?cd_materias=5976
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